Pra quem gosta de histórias mal contadas...

A vida como ela é, o mundo bizarro, monga, a mulher gorila, o maior espetáculo da terra, a luz, a sombra, a mulher, o homem, a barba, os bárbaros, as invasões, os ciganos e o gelo... tudo isso por um precinho módico.Bem vindo ao teatro das ilusões!!!

 

segunda-feira, setembro 25, 2006

 

Acidente 

Uma das definições dicionarísticas para acidente fala em “acontecimento casual, fortuito, inesperado”. Se tomarmos esse aspecto do verbete para considerar o documentário dos mineiros Cao Guimarães e Pablo Lobato, que participa da Mostra Competitiva do Festival de Cinema do Rio deste ano, fica realmente difícil evitar um olhar de esguelha para a obra. Acontecimentos fortuitos e inesperados são fenômenos raros no documentário. O que salta aos olhos, isso sim, é, parodoxalmente, um desejo incontrolável de controlar. A obsessão pela beleza da imagem parece fazer com que os diretores se ocupem exaustivamente de todos os minimos detalhes, deixando pouco espaço para acidentes de percurso.

De acordo com suas palavras, ditas antes da primeira exibição do filme (Odeon, dia 24), os diretores buscavam criar uma obra do tipo que nasce nascendo, surge, por assim dizer, à medida que a vida flui diante das câmeras. A verdade dos frames, no entanto, parece desconstruir esse discurso. O que se vê em Acidente é sobretuo cuidado, orquestração, reconstrução do real em busca de um ideal, seja de beleza, seja de discurso (com ou sem palavras).

Cada cena de Acidente parece ter sido pensada à exaustão. Enquadramento, luzes, sons, cortes, tudo parece entrar no momento exato para gerar um efeito específico. E nesse sentido, o filme até funciona. Fica, falando sem rodeios, bonito. Beleza que, no entanto, não faz de Acidente nenhuma obra-prima.

Numa acepção mais filosófica, de acordo com o Houaiss, acidente pode significar, um “aspecto casual ou fortuito de uma realidade, que, por esta razão, é irrelevante para a compreensão do que nela é essencial e imprescindível”, por exemplo, “a cor azul de um tecido é um acidente que, por sua presença, não transforma a natureza essencial desse objeto”. Sob esse ponto de vista, fica mais fácil posicionar a obra da dupla mineira. Resumidamente, o documentário registra acontecimentos do dia-a-dia de 20 pequenas cidades do interior de Minas Gerais. Bucólicas ao extremo, as localidades parecem aqueles lugares dos quais a primeira impressão que se tem é: “não acontece nada por aqui”. Tomada após tomada, Guimarães e Lobato buscam desmentir essa concepção, detendo-se com suas câmeras no “irrelevante”: um copo balançado pelo vento, uma canção caipira cantada por uma dupla de velhinhos melancolicamente felizes, uma briga de cães de rua lindamente interrompida pelo cinegrafista, flagrado por um dos animais.

Até aí tudo bem. Sabe-se do poder que tem o cinema de oferecer novas possibilidades para o olhar, novas janelas para o mundo. Acontece que no filme a observação dos “acidentes” parece esconder um desejo outro, uma vontade de compreeder “essencias”. Para isso, vale recorrer ao estilo Flaherty de documentar para re-criar situações. Há no filme a tentativa de extrair um à vontade dos personagens/pessoas que desfilam pela tela. A construção, no entanto, parece ruir diante do excesso de beleza que se quer em tudo por.

O desejo de controle pula da tela lá pelo meio do filme, quando, num ponto chave, os diretores conversam com Black, uma moça, digamos, descolada que, a seu modo, se vangloria da própria personalidade. Estamos na rua, à luz do dia. A mulher fala empolgada, exibindo orgulhosa o corpo, o seio: “Pergunta aí, todo mundo conhece a Black”. Corta. Estamos agora num quarto escuro. Noite. Sob parca iluminação, vislumbramos a silhueta da Black. É outra Black. Agora, em contraste com a imegem imediatamente anterior, seu olhar, entre as sombras, espalha no ambiente uma profunda tristeza. Ao fundo, uma música pesada ressalta o dramático da situação. Numa cena, o brilho da Black se esvai. Vemos a Black como os diretores querem que a vejamos, como alguém que “faz festa para esconder a tristeza”. De acidental, quase nada.
O interessante é que – acidentalmente? – o filme de Cao Guimarães e Pablo Lobato ganha importância no documentarismo brasileiro recente justamente por passar longe da escola Coutinho de entrevistas e metalinguagem, espaço onde o inesperado, de fato, dá as caras. Em vários pontos, Acidente tem uma estrutura clássica que, como dito acima, remete frequentemente às experiências bem sucedidas de Flaherty, nos primórdios do gênero. Em Acidente não existe a denúncia do sujeito por trás da câmera. Interessa mais a construção do que a reflexão. A beleza, em Acidente, está na justamente na ausência do acidente.

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